terça-feira, 14 de dezembro de 2010

3 - Discurso da Formatura de 2010

Pessoal, seguem abaixo os discursos que fiz para os formandos do Ensino Médio do Galois do ano de 2010. O Discurso Um foi feito na Aula da Saudade (6 de dezembro) e o Discurso Dois foi feito na Colação de Grau (8 de dezembro). No final da postagem está a mensagem que coloquei para os formandos no “canudo” que eles receberam na noite da formatura.

DISCURSO UM (Aula da Saudade, 6 de dezembro)



Boa noite

Srs. Diretores, prezados professores e colegas, queridos formandos.

Quero parabenizar a Comissão de Formatura pelo seu trabalho, especialmente por essa bela solenidade.

Quero também agradecer a vocês formandos pelo convite para ser o paraninfo.
Foi com grande alegria que recebi o convite. Nos meus 26 anos de carreira esta é a segunda vez que sou paraninfo, a última foi há 18 anos. Mesmo assim, na época a estrutura da celebração foi bem diferente e mais simples do que esta.

Esta é a primeira Aula da Saudade de que participo. Na sua versão mais tradicional, a Aula da Saudade é a última aula dos formandos, ministrada pelo paraninfo. De fato, na forma adotada por vocês, fui obrigado a elaborar dois discursos para ocasiões diferentes, mas envolvendo o mesmo tema – uma celebração da vitória de vocês nessa etapa da sua formação, uma reflexão final sobre esse momento tão marcante e uma orientação para continuarem adiante.

Vocês escolheram o Galois para essa etapa de sua formação. Muitos o escolheram desde as séries do Ensino Fundamental, outros no início do Ensino Médio e alguns nesse ano final. Todos estão encerrando aqui o que chamamos de ciclo da Educação Básica: no caso de vocês, foram 11 anos de ensino obrigatório, momento essencial na formação de sua cidadania. Nessa perspectiva, a Aula da Saudade é uma despedida de uma etapa fundamental de suas vidas. Possivelmente, eu e os demais professores, vamos encontrar alguns de vocês no cursinho durante as aulas de revisão para o vestibular. Mas as aulas do Ensino Médio como vocês se acostumaram acabaram.

Na universidade, vocês vão encontrar outro tipo de aula. Aí sim sentirão saudades de nós! Mas isso será apenas no início. Rapidamente vocês vão se adaptar a realidade do Ensino Superior. E vocês vão conseguir isso não só por causa de suas inteligências, mas também por causa da aprendizagem, do conhecimento, das experiências, das habilidades e dos valores que vocês adquiriram conosco.

Da minha parte, fui muito além do conteúdo tradicionalmente cobrado nos vestibulares. Apresentei alguns momentos da história do século XX que considero relevantes, primeiro, para vocês refletirem sobre o presente e sobre o lugar de vocês na própria história – história que está sempre sendo construída, em uma construção eternamente incompleta e de arquitetura indefinida. Conscientes ou não, vocês participam dessa construção e sua participação será mais ativa de hoje em diante.

Mas os fatos que estudamos servem também para a construção da bagagem cultural de vocês, independente da carreira que escolherem. Conhecer o passado da humanidade, e não apenas o passado nacional, não pode ser exclusividade de historiadores e dos outros cientistas sociais. O sucesso de livros de divulgação de história, de romances históricos e de filmes com temas históricos demonstra isso.

Além disso, e para mim esse foi um dos objetivos mais importantes, tentei mostrar que muitas vezes a interpretação da história apresentada nos livros didáticos, cobrada nos vestibulares e difundida em parte da mídia é uma versão ideologizada do passado, mais comprometida em atender a uma agenda política do presente do que em compreender o que aconteceu. Essa versão convencional (ou política) da história simplifica o passado e omite conscientemente as informações que contradizem o seu paradigma ideológico.

Não é possível mais sustentar uma visão de mundo, baseada em uma interpretação propositalmente deturpada e maniqueísta do passado, que reduz os acontecimentos históricos a sua base econômica, minimizando outros fatores; uma visão de mundo que afirma ser a luta de classes a essência da história; uma visão de mundo que impõe a idéia de que a riqueza individual é incompatível com a redução da pobreza ou mesmo com a eliminação da miséria, indo contra todas as evidências em contrário; uma visão de mundo que, em nome da correção de injustiças cometidas no passado, acabam estabelecendo uma nova desigualdade de direitos; uma visão de mundo que afirma que, em nome de supostos interesses coletivos, devem ser reduzidas ou mesmo suprimidas as liberdades individuais (entre elas o direito de pensar diferente, de poder dizer não e de apontar erros e desvios, sobretudo das autoridades públicas).

Na época em que vivemos, a profusão de informações a nossa disposição muitas vezes nos confundem mais do que nos esclarecem – o efeito Chacrinha. Uma versão simplista da realidade é, assim, naturalmente uma grande tentação. Ela traz certo conforto mental e nos poupa de um grande esforço intelectual para compreender o mundo.

Queridos formandos, peço que continuem a aprender. Não se rendam às versões simplistas da realidade, mesmo quando transfiguradas de seriedade científica. Leiam, comparem, chequem as informações e construam de forma consciente e honesta, respeitando seu semelhante e as leis. Não tenham medo de ir contra a maré, cuidado com o contágio de algumas unanimidades. Mantenham seus ideais de sucesso pessoal e de participação nessa obra coletiva que é construir uma nação e uma humanidade melhores.

Felicidades e saudades

Cássio Tunes

DISCURSO DOIS (Formatura, 8 de dezembro de 2010)

Boa noite

Professora Dulcinéia Marques, Srs. Diretores, prezados professores e colegas, pais, familiares, amigos e queridos formandos.

Em primeiro lugar, quero mais uma vez agradecer a vocês, formandos do Ensino Médio do Galois, pelo convite para ser o paraninfo. Como eu disse anteontem, foi com uma alegria muito grande que recebi o convite de vocês. Para mim é uma honra.

Na Aula da Saudade, falei para vocês não se renderem as versões simplistas, maniqueístas e ideologizadas da História e da realidade social como um todo. Falei que o sucesso profissional e material, se construído com honestidade e respeito às leis, não é motivo de vergonha. Vocês não estarão roubando a riqueza de ninguém com isso. Ao contrário, vocês estarão acrescentando riqueza (capital) intelectual e material a sociedade.

Ontem, na Missa de Formatura, o padre, numa bela oratória com a qual não tenho condições de sonhar em competir, falou para vocês em esperança.

A Dulcinéia, também ontem, falou para vocês sobre o papel do Galois em sua formação. Ela também falou sobre agradecimento – no caso, o agradecimento que vocês, que nós, devemos fazer constantemente a Deus pela presença Dele em nossas vidas. O que ela quis também dizer é que reconhecer isso – reconhecer essa presença divina e, portanto, misteriosa – é reconhecer a nossa humilde humanidade. Conquistamos o mundo e o transformamos, mas não somos deuses. Somos criaturas.

Esta noite, vou falar de outra coisa: vou falar de herança, vou falar de legado.
O ano de 2010 ainda não se encerrou. Faltam três semanas para o seu término. A História nos mostra que é necessário um pouco de cautela quando consideramos o ano como encerrado já na primeira semana de dezembro. Por exemplo:

No dia 13 de dezembro de 1968, foi decretado o AI-5 – o Ato Institucional N o 5, como vocês sabem. O ano de 1968 costuma ser lembrado na nossa história, mais especificamente na história do Regime Militar, como o ano do AI-5. Mas ele só foi lançado faltando duas semanas para o ano terminar.
Se fossemos americanos, vivendo nos EUA em 1941, em
uma cerimônia com estudantes do High School na noite de 8 de dezembro, estaríamos comentando, estarrecidos, o ataque do Japão a Pearl Harbor, no Havaí, ontem (7 de dezembro) – fato que “nos” empurrou para a guerra contra os japoneses. No sábado, dia 11 de dezembro, ficaríamos ainda mais chocados com a notícia de que a Alemanha nazista também tinha declarado guerra contra os EUA. Na prática o governo americano já estava em uma situação de quase-guerra com o Eixo, mas para o povo dos EUA, e isso no final foi o que pesou mais, eles entraram na maior de todas as guerras no momento em que faziam as compras de Natal.

No dia 27 de dezembro de 1979, a URSS invadiu o Afeganistão. Eu tenho a impressão que poucos dão conta do que isso significou para a configuração do mundo atual. Um fato cujos desdobramentos estão sendo sentidos até hoje.

Ainda assim, arrisco dizer um tanto imprudentemente que o ano de 2010 está praticamente concluído.

Dizer que o ano de 2010 foi um ano especial para vocês é dizer o óbvio. Todo ano é um ano especial em nossas vidas. Alguns anos, no entanto, tornam-se mais especiais do que outros.

Muitas vezes, um ano é especialmente marcante na história de um povo ou mesmo da humanidade. O ano de 2010, por exemplo, entrou para a nossa história. Pela primeira vez no Brasil, uma mulher foi eleita para a presidência da República. Independente das preferências políticas e ideológicas de cada um de nós, não resta dúvida que foi um marco na nossa história.

Mas e no plano individual? E na história particular de cada um de nós? Para uns, infelizmente, alguns anos são mais lembrados por uma dor pessoal: o ano em que perdemos um ente querido, o ano em que sofremos com uma terrível doença, o ano de uma tragédia na família, um ano de insuportáveis dificuldades. Para outros, alguns anos ficaram marcados por algum acontecimento especialmente feliz: o ano em que iniciamos uma nova e duradoura amizade, o ano em que começamos a namorar, o ano da “primeira vez”, o ano do casamento (que para alguns é uma lembrança trágica), o ano do nascimento de um filho, o ano do primeiro emprego (com carteira assinada), o ano em que encerramos um ciclo de nossas vidas para iniciarmos outro.

Para vocês, o ano de 2010 se encaixa também nesse último caso: o ano em que encerraram um ciclo. Porém, como disse na Aula da Saudade, 2010 não é simplesmente o ano em que vocês terminaram a Terceira Série do Ensino Médio. Na verdade, 2010 é o ano em que vocês encerraram o ciclo da Educação Básica. Repito o que disse anteontem: no caso de vocês foram 11 anos de ensino obrigatório, momento essencial na formação de sua cidadania.

Fazendo as contas, isso significa o ciclo educacional básico da geração nascida entre 1992 e 1994.

A palavra geração é um termo de aplicação difícil. Ela sugere que as pessoas nascidas em uma determinada época compartilham as mesmas idéias, hábitos e expectativas, muitas vezes diferentes das gerações anteriores. Não é bem assim. Qualquer geração será composta por indivíduos com idéias e atitudes diferentes. Não é possível afirmar que todos nascidos no início dos anos 50, por exemplo, agiram ou estavam fadados a agir em uníssono no final dos anos 60 diante de desafios coletivos, nacionais ou mundiais.

Mesmo assim, um ponto une os diversos indivíduos de uma mesma geração quando ela entra na idade adulta e passa a atuar mais decisivamente em seu meio social: a nova geração encontra uma realidade construída pelas gerações anteriores.

Obviamente, a nova geração, quando criança e adolescente, tende a ser mais passiva do que ativa na construção do mundo. Ela recebe mais do que fornece. Os fundamentos de sua formação são construídos nesse momento, no ciclo básico. Foi o caso de vocês.
Ao iniciar a fase adulta, entrando nos estudos superiores e no mercado de trabalho, completando a sua cidadania formal com a maioridade legal, vocês vão desenvolver melhores condições para agir mais consciente e ativamente no mundo.

Vocês podem fazer isso de uma forma egoísta ou de uma forma altruísta. Mas farão isso em um mundo pré-existente, ainda que inacabado.

Que mundo e que Brasil vocês estão recebendo?

Em princípio, vocês ainda não têm condições de avaliar o mundo que estão recebendo. Não basta ter uma perspectiva histórica. É necessário participar diretamente da construção de uma carreira e de uma família para entender os desafios e os limites da aplicação de nosso potencial.

O esforço pessoal, a paixão pelo conhecimento e a dedicação nos estudos e na carreira profissional são fundamentais. Sem eles, não há como começar e muito menos prosseguir. Nós vivemos em uma época que se acostumou a dizer “Basta querer, que você consegue”. Destacamos o empenho individual para valorizar a livre iniciativa, no sentido amplo do termo. Mas a realidade é mais complexa. O contexto, o meio, o momento histórico pesam e limitam nossas opções.

Imaginem um formando em jornalismo, no Brasil em 1970 ou 1971, com a intenção de seguir a carreira de jornalista político.

Imaginem um adolescente judeu inteligente, brilhante, cheio de ideais, encerrando o Ensino Médio, ou o seu equivalente, na Alemanha em 1933. “Basta querer, que você consegue”?

Imaginem um jovem estudante negro, de 16 anos, cheio de sonhos, no estado do Alabama, nos EUA, na década de 1920 ou de 1950, duas décadas de extraordinário crescimento econômico e de oportunidades naquele país. “Basta querer, que você consegue”?

Imaginem uma promissora jovem, que poderia ser uma médica, uma advogada, uma engenheira, uma professora, vivendo no Afeganistão sob o governo dos talibãs. “Basta querer, que você consegue”?

Retorno a pergunta: que mundo e que Brasil vocês estão recebendo?

Certamente, um mundo e um país cheio de problemas e desafios. Mas um mundo e um país melhores do que aquele encontrado pela geração que encerrou o Ensino Médio por volta de 1980, há 30 anos, portanto. A minha geração.

Vocês cresceram no mundo pós-Guerra Fria e em um Brasil democrático. Vocês não conheceram, não passaram pela experiência, de viver em um mundo ameaçado pela guerra nuclear. Vocês não viveram uma adolescência sob a expectativa de que um conflito localizado poderia escapar ao controle do realismo político e evoluir para um confronto de grandes proporções, afetando todos, absolutamente, todos os seres humanos. Obviamente, esse perigo nuclear não desapareceu por completo (teoricamente só desaparecerá quando todas as armas nucleares forem abolidas), mas não resta dúvida de que ele diminuiu drasticamente.

Todos os pais e avós aqui presentes nasceram em um mundo onde havia um país chamado União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. Muitos a viam como uma ameaça, outros como uma esperança e outros ainda como uma incógnita. Mas acho que pouquíssimos, entre os que tinham mais de 18 anos em 1991, imaginariam ver seu filho adolescente estudar a história da URSS como uma relíquia de uma era que acabou.

Vocês não conheceram uma economia de inflação disparada como nós conhecemos. Vocês sabem o que é administrar uma mesada em uma situação de hiperinflação?

Vocês não tiveram uma década perdida.

Meus queridos, vocês não precisaram enfrentar um governo autoritário para obter a liberdade e a democracia que devem caracterizar toda nação moderna – enfrentamento que na minha geração foi certamente menos violento do que aquele vivenciado pelos formandos dos anos 60 e do início dos anos 70.

Vocês não sabem o que é o cotidiano, o trabalho, a diversão e a comunicação em um mundo sem o computador pessoal, sem a internet, sem o celular, sem a TV a cabo, sem blogs, páginas pessoais, Facebook, Orkut, sem o iphone, ipod, ipad e outros “ais” ou “is” da Era da Informática, que alguns temem que se transforme na Era da “I”formática. Muitos jovens no nosso país ainda sabem o que é a vida sem essa tecnologia. Não se esqueçam disso. Ninguém aqui pode esquecer isso.

Vocês estão recebendo um país mais próspero, mais estável e mais democrático. Um mundo relativamente mais pacífico e certamente menos tenso do que ele foi entre 1900 e 1990.

Muitos dos problemas que minha geração e as anteriores enfrentaram não foram resolvidos. Por exemplo, a pobreza em larga escala, a corrupção, a educação (sobretudo a pública), a paz mundial.

Outros problemas cresceram em um ritmo alarmante há 15-18 anos acompanhando a geração de vocês, muitas vezes exercendo uma maléfica influência em sua formação: a destruição do meio ambiente, o consumo de drogas, a criminalidade, o hedonismo desenfreado, o relativismo cultural (todos os valores são igualados, logo todos são válidos, implicando no repúdio aos valores tradicionais, no permissivismo irresponsável e no desrespeito geral). A violência no trânsito e o terrorismo global são outros problemas, entre tantos, que avançaram dessa última década.

Mesmo algumas conquistas essenciais não estão de forma alguma consolidadas. A democracia, a liberdade de pensamento e de crítica, o controle da inflação, o diálogo internacional são como plantas que precisam ser constantemente regadas, tratadas e defendidas das pragas. Estas, as pragas – ou seja, as ameaças a democracia e a liberdade de crítica – nunca vão desaparecer. Estão sempre a espreita, agindo ou buscando oportunidade para agir. Como já comentei em outras ocasiões, pretextos é que não faltam. Muitas vezes o pretexto para reduzir a liberdade é o aperfeiçoamento ou a ampliação da própria democracia. Outras vezes, em nome do progresso social, a liberdade individual é sacrificada.

Assim, muita coisa foi construída para o nosso usufruto e para o usufruto de vocês. Mas a obra nunca será concluída e precisa constantemente de reformas, ajustes, acréscimos.

A história é uma mistura de mudança e de permanência, de transformação e de conservação, mistura compartilhada, em qualquer momento, por todas as gerações viventes. A geração nascida na década de 1930, ou antes dela, continua atuando na construção do presente, junto com as gerações nascidas nas décadas de 40, 50, 60, 70, 80 e a de vocês, a geração dos anos 90. Reconhecer esse complexo processo de construção, desabamentos e reconstrução do mundo é reconhecer a própria história e nosso papel nela. Mas é também reconhecer que o que foi deixado para vocês foi resultado de um grande esforço individual e coletivo.

O que vocês farão com essa herança? O que vocês podem acrescentar?

Com o que vocês estão recebendo, com o que vocês já dominam, sobretudo na tecnologia da Revolução da Informática, nós poderemos dar um salto. Poucas vezes na história o potencial criativo de uma nova geração sobre a sua predecessora foi tão bem demonstrado como agora. E é a partir de agora ou do próximo ano, com vocês entrando na idade adulta, estudando na universidade, transformando-se em profissionais e exercendo plenamente sua cidadania (com todos os direitos e as responsabilidades que a acompanham) que será, de fato, sentido o impacto de sua geração.

De fato, agora, não temos mais a relação formal de aluno-professor. Nós somos concidadãos, nós somos companheiros, nós somos irmãos. Hoje não é o “Saint Crispin and Crispinian Day”, mas nós somos, a partir de agora, “a band of brothers”.

Convido vocês a se juntarem as antigas gerações e a continuar a construção de um mundo melhor.Nessa construção, precisamos preservar e fortalecer o maior legado deixado pelos nossos antepassados, que supera qualquer conquista tecnológica, econômica ou política da história. Refiro-me a cultura da bondade, de querer fazer o bem, uma tradição de mais de dois milênios, de origem judaico-cristã. A fórmula é simples, mas sua aplicação é reconhecidamente difícil: ajude o próximo, trate o seu semelhante como gostaria de ser tratado, reconheça seus erros, respeite a lei em um regime de democracia e de isonomia, combata a injustiça e a opressão.

No final de tudo, pessoal, o que deixamos de lembrança? Uma obra e nosso nome vinculado a ela.

Como vocês desejam ser lembrados?

Como reflexão, quero encerrar com a leitura de um texto. Ele é parte de um livro, escrito originalmente em hebraico, nas primeiras décadas do século II aC (entre 200 e 175 aC), em Jerusalém. O seu autor é um escriba judeu, Yeshuah Ben Sirach. Por essa razão o livro foi chamado de Sirácida. Mas ele é mais conhecido pelo seu título latino Ecclesiasticus, em português Eclesiástico. O Eclesiástico faz parte da Bíblia Católica e da Bíblia Ortodoxa, mas não foi incorporado a maioria das bíblias protestantes, nem mesmo na Bíblia Hebraica. O trecho que vou ler está no capítulo 44 e se chama “Elogio dos Antepassados”:

“Façamos o elogio dos homens ilustres, nossos antepassados através das gerações.

O Senhor manifestou neles glória imensa, sua grandeza desde os tempos antigos.

Uns exerceram o governo em seus reinos e tornaram-se famosos por seu poder;

Outros foram renomados em inteligência e dotados de prudência, e fizeram revelações em profecias.

Uns guiaram o povo com seus conselhos e com a sua habilidade em escrever, fornecendo palavras sábias para a sua instrução.

Outros, ainda, compuseram cânticos melodiosos e escreveram narrativas poéticas;

Alguns foram ricos e dotados de força, vivendo em paz nas suas casas.

Todos esses foram honrados por seus contemporâneos e glorificados ainda em vida.

Alguns deles deixaram um nome que se proclama com louvores.

Outros não deixaram lembrança alguma, desaparecendo como se não tivessem existido.

Viveram como se não tivessem vivido, assim como seus filhos depois deles.

Agora, porém, falemos dos homens de bem, pois seus gestos de bondade não foram
esquecidos;

Eles permanecem com os seus descendentes: seus netos são a sua melhor herança.

A descendência deles mantém-se fiel às alianças e, graças a eles, também os seus filhos.

A descendência deles permanece para sempre, e sua glória não lhes será tirada.

Seu nome vive através das gerações.”


Queridos formandos, avancem em seus estudos, sejam bons profissionais e continuem sendo boas pessoas.

Eu não tenho uma sala exclusiva no Galois. A equipe de História do Ensino Médio não tem uma sala. A minha sala é a sala dos professores, compartilhada por todos nós. Tenho certeza que falo pelos meus colegas: a porta dessa sala continuará sempre aberta para todos vocês.

Obrigado.

MENSAGEM DA FORMATURA (8 de dezembro de 2010)

Amanhã, em um sentido muito real, sua vida – a vida que você vai construir por conta própria a partir do seu rascunho – começa.

Como você usará seus dons? Que escolhas você fará?

Será a inércia o seu guia, ou você vai seguir as suas paixões?

Você seguirá o dogma, ou você será original?

Você irá escolher uma vida fácil, ou uma vida de serviço e de aventura?

Você irá murchar quando criticado, ou você vai seguir com suas convicções?

Você vai blefar quando estiver errado, ou você vai pedir desculpas?

Você vai fechar o seu coração para se proteger contra a rejeição, ou você vai agir quando se apaixonar?

Você vai jogar com prudência, ou com um pouco de fanfarra?

Quando for difícil, você irá desistir, ou você será implacável?

Você será um cínico, ou você será um construtor?

Você será inteligente em detrimento dos outros, ou você será generoso?

Eu vou arriscar uma previsão. Quando você tiver 80 anos e em um momento silencioso de reflexão, narrando apenas para você mesmo a versão mais pessoal de sua história de vida, a narração que vai ser a mais concisa e significativa será a série de escolhas que você fez. No final, nós somos nossas escolhas. Construa para você uma grande história.

Jeff Bezos, fundador e presidente da Amazon.com

quarta-feira, 21 de abril de 2010

4 - A Idade Contemporânea

1. Aspectos gerais da Idade Contemporânea 

De acordo com a divisão tradicional da história, a Idade Contemporânea corresponde ao período iniciado na segunda metade do século XVIII e que se estende até os dias atuais. Em suas linhas gerais, essa época se destaca em três aspectos: a modernização das sociedades, a afirmação do capitalismo e a supremacia econômica e militar do Ocidente no mundo.

1.1 A modernização das sociedades

(a) Modernização

Modernização é a transformação das sociedades tradicionais ou agrárias em sociedades modernas ou industriais. Na sociedade tradicional, a maioria da população vive no meio rural, há um predomínio da agricultura, baixa mobilidade social, lento desenvolvimento tecnológico e forte religiosidade. A sociedade moderna (modernidade), por sua vez, é caracterizada pela industrialização, intensa urbanização, alfabetização em massa, maior mobilidade social e diversidade de profissões, avanço tecnológico mais rápido, crença no racionalismo e no progresso e pela expansão do pensamento secular na política e no ensino em detrimento da religião (secularização). Em razão do seu significado revolucionário na história, a modernidade, entendida como a fase de industrialização e secularização da sociedade, foi o fenômeno mais importante da Idade Contemporânea.

(b) O avanço da modernidade

A modernidade nasceu na Europa Ocidental em 1760-1800 com o início da Revolução Industrial e o triunfo do Iluminismo. Por meio pacíficos (influência cultural, contatos comerciais) e violentos (imperialismo, ameaças militares), a modernidade expandiu-se da Europa para o mundo nos séculos XIX e XX, em momentos e condições diversas que variaram de país em país. Por se tratar de um processo dinâmico e contínuo de mudanças tecnológicas, econômicas, sociais, políticas e culturais é difícil determinar em que momento a modernidade ficou ou ficará plenamente consolidada. Consequentemente, não há acordo sobre o que seria o início de uma época pós-moderna ou de pós-modernidade na história das sociedades.

(c) Problemas da modernidade

A modernidade trouxe ganhos incalculáveis para a humanidade, sobretudo em termos do aumento da produção e da produtividade econômica, do conhecimento científico, do desenvolvimento dos meios de transportes e comunicação e do avanço da medicina. Tudo isso possibilitou a redução da mortalidade, o aumento da natalidade e um crescimento extraordinário da população mundial. A mulher, que geralmente nas sociedades tradicionais possui status inferior ao do homem, foi emancipada e obteve isonomia jurídica e política. Nas sociedades mais modernas, isso foi acompanhado pela elevação do padrão de vida da maioria esmagadora das pessoas, se comparado ao padrão dos seus antepassados da época pré-moderna.
No entanto, a construção da modernidade ao longo da Idade Contemporânea gerou diversos problemas. De uma maneira geral, a modernização foi ou é um processo traumático, muitas vezes violento, sobretudo quando ocorrida de uma forma rápida. Com efeito, a modernização destrói hábitos e modos de vida tradicionais e enraizados. Antigas profissões, funções, cargos e privilégios são eliminados. O papel central da família na educação e na produção nas sociedades pré-industriais é deslocado ou superado. As interpretações e verdades religiosas são questionadas. O resultado são conflitos de valores, incertezas e insegurança. Em alguns casos, isso gerou uma reação de grupos políticos e religiosos radicais (extremistas, fundamentalistas) que, ao condenar diversos aspectos da modernidade, passaram a idealizar o passado pré-moderno, buscando restaurá-lo, ainda que parcialmente, muitas vezes por meios violentos. Esse tipo de conservadorismo radical e de reacionarismo religioso sempre existiu no processo de modernização, mas desde o final do século XX ele vem adquirindo maior importância.
Outro problema da modernidade é a aceleração da degradação ambiental, como a poluição e a destruição da vegetação natural, em razão da industrialização, da urbanização e do crescimento populacional. A preocupação do homem moderno com essa questão ambiental remonta ao século XIX, mas ela só ganhou relevância na segunda metade do século XX, transformando-se em uma das pautas mais relevantes das discussões políticas da atualidade.

1.2 A afirmação do capitalismo

(a) O capitalismo

O capitalismo é uma forma de produção e de distribuição de bens, serviços e informações caracterizada pela economia de mercado (produção voltada para o comércio, busca do lucro, acumulação de capital, concorrência), propriedade privada do capital, trabalho livre e assalariado e racionalização econômica. Suas origens mais remotas encontram-se na Baixa Idade Média (séculos XI-XV), mas ele só foi consolidado como um modo de produção a partir da Revolução Industrial, quer dizer, com o desenvolvimento das sociedades modernas na Idade Contemporânea. Com efeito, o capitalismo está tão associado à modernidade que muitos consideram que ele faz parte de qualquer processo de modernização. De fato, nos séculos XIX e XX o sistema capitalista passou a predominar em grande parte dos países modernos, sobretudo nos mais ricos. Rússia e China, nesse caso, foram as principais exceções já que no século XX ambas trocaram um capitalismo pouco desenvolvido, de formação tardia, por décadas de experiência socialista – um violento processo de modernização não-capitalista imposto pelo Estado, com pouca ou nenhuma participação da iniciativa privada. Contudo, na complexa rede de relações econômicas e políticas internacionais do mundo contemporâneo, marcadas pela competição e rivalidades, o modelo estatizante ou socialista de modernização não conseguiu se sustentar por muito tempo. No final do século XX, a modernidade socialista tornou-se simplesmente inviável e os países que a adotaram estão sendo forçados a retornar ao capitalismo, uns de uma forma mais lenta e parcial do que outros.

(b) Globalização

A combinação dos avanços tecnológicos da modernidade nos transportes, comunicações e produtividade com os impulsos comerciais do capitalismo resultaram na criação de um mercado mundial cada vez mais unificado, ou seja, na criação de um sistema econômico mundial com redes de interdependência dos mercados nacionais. Esse fenômeno é o que se convencionou chamar de globalização – o processo de integração do comércio, finanças e produção dos países em escala regional e mundial, iniciado com a Revolução Comercial nos séculos XV-XVIII e consolidado com os desdobramentos da Revolução Industrial nos séculos XIX-XX.

1.3 A supremacia do Ocidente

(a) Civilização

O termo Ocidente, utilizado em um sentido cultural e não no sentido geográfico original, corresponde a uma visão da História. Essa visão considera que, ao longo dos séculos, a humanidade dividiu-se em grandes agrupamentos culturais ou civilizações. Cada civilização é constituída por povos que compartilham diversos elementos ideológicos e políticos comuns, como religião, valores, normas e instituições, distintos daqueles de outros povos. Segundo essa interpretação, o núcleo de uma civilização é formado pelos seus países mais ricos e poderosos – os Estados-núcleos.

(b) A civilização ocidental

Nessa visão, Ocidente é o mesmo que civilização ocidental, constituída pela Europa (onde essa civilização se originou) e os países de intenso povoamento europeu da América e da Oceania. Apesar de cada uma das diversas sociedades do Ocidente possuir características culturais particulares ou únicas (sua identidade cultural nacional), elas estariam unidas por uma cultura mais ampla comum baseada na fusão das tradições greco-romanas, judaico-cristãs e germânicas. Os principais elementos culturais da civilização ocidental são o legado clássico (filosofia e racionalismo gregos, o Direito romano, o conceito de cidadania), o cristianismo, a tradição medieval de constitucionalismo (a lei limitando o poder do governo) e de corpos representativos (parlamento) e o individualismo. Até 1914, quando eclodiu a Primeira Guerra Mundial, a Europa foi o núcleo do Ocidente. Entre 1914 e 1945, o núcleo foi baseado em um equilíbrio entre a Europa e os EUA. Depois de 1945, os EUA assumiram a posição de principal Estado-núcleo da civilização ocidental, ainda que essa posição tenha sido desafiada pela força militar da URSS durante a fase da Guerra Fria (1945-1991).

(c) O poder mundial do Ocidente

Como o Ocidente, ou mais precisamente o seu núcleo europeu e norte-americano, foi pioneiro na modernização, ele se transformou na civilização mais poderosa do mundo na Idade Contemporânea, superando as demais em termos de poder econômico e militar e de influência política e cultural em escala global. Essa superioridade possibilitou que as potências ocidentais dominassem, direta ou indiretamente, grande parte da Ásia e da África, sobretudo em 1830-1960. Em razão disso, o imperialismo ocidental exportou a modernidade para as sociedades asiáticas e africanas, de forma plena ou parcial dependendo do caso – a modernização via colonialismo ou como reação nacionalista contra o colonialismo. Nesse contexto, o primeiro país não-ocidental a se modernizar foi o Japão, em 1870-1900, que se transformou em um poderoso competidor do Ocidente pelo domínio do Extremo Oriente. De fato, a supremacia ocidental vem declinando desde o século XX com a modernização das civilizações da Ásia – além do Japão, sobretudo a China e a Índia. Valores, costumes e hábitos de origem oriental estão em expansão na América e na Europa. O islamismo é a religião que mais cresce no mundo e os muçulmanos são cada vez mais numerosos nas sociedades européias. O resultado é que hoje o poder e a influência globais do Ocidente são proporcionalmente menores do que eram há 50 anos. Contudo, a “Era da supremacia ocidental” ainda não foi superada e o Ocidente continua sendo a civilização mais poderosa do mundo em termos econômicos e militares.

2. A periodização da Idade Contemporânea

A Idade Contemporânea pode ser subdividida em períodos específicos. Se levarmos em consideração as alterações decorrentes dos impactos das grandes revoluções e conflitos internacionais, é possível delimitar 3 períodos nesse últimos 250 anos da história:

Longo Século XIX (1774-1914): marcado pelo duplo impacto econômico-geopolítico da Revolução Industrial britânica e político-ideológico da Revolução Americana e, principalmente, da Revolução Francesa.

Breve Século XX (1914-1991): caracterizado pelos desdobramentos geopolíticos da Primeira Guerra Mundial (ascensão dos EUA como principal potência capitalista) e político-ideológico da Revolução Russa (criação da URSS e do regime socialista)

“Incerto” Século XXI (1991 em diante): marcado pelo impacto do colapso da URSS, do fracasso dos regimes socialistas e pela transformação dos EUA em uma “hiperpotência” militar, com um poder global sem paralelo na história.

3. Imperialismo e colonialismo

3.1 Imperialismo

Imperialismo é a tentativa de expansão do poder de uma potência sobre outros territórios e povos com o objetivo de estabelecer algum tipo de domínio ou de controle sobre eles. Na maioria dos casos, a potência imperialista é um Estado, com governo, forças armadas e funcionários civis. Algumas vezes, entretanto, o imperialismo é resultado da ação de organizações tribais, grupos de indivíduos ou de empresas privadas, em princípio agindo de forma independente do governo. O imperialismo pode ser motivado por questões econômicas (busca de terras, matérias-primas, mercados, áreas de investimento), políticas (ampliar o poder internacional de um Estado, dominar um rival em potencial, controlar uma área estrategicamente importante para a defesa nacional, obter prestígio nacional, desviar a atenção dos problemas internos do país) e ideológicas (difundir, pela força, uma doutrina religiosa ou política secular). O imperialismo é um fenômeno antigo na história das relações internacionais, ocorrendo em sociedades tradicionais e modernas, não-capitalistas e capitalistas.

3.2 Colonialismo

Colonialismo é o domínio de um país ou povo por uma potência imperialista, resultado de um imperialismo bem-sucedido (quando o imperialismo fracassa, não há colonialismo). O colonialismo implica na existência de um império colonial ou sistema colonial: uma relação internacional de dominação entre um centro de poder ou metrópole (a potência imperialista) e sua periferia ou colônia (o território dominado). Como no caso do imperialismo, o colonialismo na maioria das vezes é organizado por um Estado, mas ocasionalmente ele também pode ser estabelecido por grupos privados. Mas mesmo quando o colonialismo é uma iniciativa de forças não-governamentais, o Estado acaba se envolvendo direta ou indiretamente sobre ele.
O colonialismo pode ser dividido em dois tipos: (a) colonialismo formal ou direto: quando a potência imperialista governa um outro país que, além de não possuir independência política, tem sua economia dominada pela metrópole. Nesse colonialismo, as colônias constituem o império formal de um Estado imperialista; (b) colonialismo informal ou indireto: quando um povo possui independência política, quer dizer, tem seu próprio Estado, mas depende economicamente de uma potência imperialista, ou está subordinado a sua diplomacia e poder militar (os chamados protetorados). Esses países dependentes, de soberania limitada, podem ser considerados “semicolônias” de uma potência imperialista e constituem seu império informal, ou seja, uma área de influência dessa potência, que ela procura preservar face ao imperialismo de seus rivais. Alguns autores também chamam o colonialismo informal econômico de neocolonialismo.

O domínio colonial e suas limitações. Na prática, a dominação colonial é mantida pela combinação do uso da força bruta (violência) com a influência cultural (ideológica) da metrópole sobre a colônia. Historicamente, quando o poder militar de uma metrópole ficava enfraquecido ou reduzido por causa de guerras ou problemas econômicos, a sua capacidade de dominar a colônia diminuía e as chances da população colonial obter a independência aumentavam – obviamente, se essa população considerasse a independência uma necessidade. Por outro lado, não bastava apenas a força militar ou a repressão para garantir a dominação colonialista. Era fundamental que uma parte da população da colônia (geralmente as elites coloniais, descendente de conquistadores e de imigrantes da metrópole, ou mesmo de origem nas etnias nativas) aceitasse o colonialismo para que fosse garantido um mínimo de estabilidade e funcionamento do sistema colonial. De fato, o colonialismo podia ou pode ser aceito por vários motivos: interesses econômicos dos colonos na metrópole (comércio, empréstimos), reconhecimento da importância da metrópole para a segurança dos colonos (defesa contra revoltas de nativos ou de escravos, proteção contra invasores estrangeiros) e identificação cultural dos colonos com a metrópole. Outros fatores como o conformismo e a passividade da maior parte da população colonial também tiveram um grande peso na manutenção do colonialismo. De qualquer forma, quando os setores mais poderosos da sociedade colonial passaram a considerar que a metrópole não apenas deixara de atender aos seus interesses, mas passara também a contrariá-los ou ameaça-los, o colonialismo mantido exclusivamente por meio da violência demonstrou ser inviável.

3.3 Imperialismo e colonialismo na história

Durante séculos, o imperialismo foi considerado prática normal na política internacional. Seu apogeu costuma ser situado entre a década de 1870 e a Primeira Guerra Mundial (1914-1918) – a fase “clássica” do imperialismo, quando as principais potências imperialistas eram Estados europeus, sobretudo a Grã-Bretanha, a França e a Rússia, seguidos pelo Japão e EUA. Hoje em dia tanto o imperialismo quanto o colonialismo são políticas moralmente condenáveis. Os dois termos possuem uma pesada carga emocional, sendo empregados com freqüência para criticar ou desacreditar a política externa de um governo. Chamar um Estado de “imperialista” é o mesmo que chamá-lo de agressor, dominador ou explorador – uma potência que ameaça a independência e liberdade de outras nações. Fenômeno complexo, ao mesmo tempo em que foi responsável pela submissão, exploração e, em alguns casos, extermínio de diversos povos, causando guerras, humilhação e sofrimento, o imperialismo permitiu a expansão de idéias e técnicas entre países, contribuindo decisivamente para as trocas culturais, a modernização da infra-estrutura dos territórios coloniais e a integração de comunidades de várias regiões e continentes. Além disso, o imperialismo despertou nas populações dominadas, ou ameaçadas de serem conquistadas, um sentimento de nacionalidade que não existia ou que estava pouco desenvolvido até a chegada da potência imperialista. Muitas nações construíram sua identidade nacional na luta contra o imperialismo e o colonialismo, e é possível que, se não fosse pelo confronto com estrangeiros dominadores, vários povos até então divididos em tribos ou pequenos Estados compartilhando uma mesma língua e cultura não teriam “despertado” para a necessidade de união pela soberania nacional e não teriam criado Estados nacionais unificados. Em outras palavras, o imperialismo e o colonialismo foram fatores fundamentais tanto para o processo de globalização como para a formação de nações.

quinta-feira, 15 de abril de 2010

5 - A mente revolucionária

Em um texto sobre a situação política do Brasil, o filósofo Olavo de Carvalho escreveu um interessante comentário sobre a mentalidade revolucionária, que ele remete ao Iluminismo:

Todo sujeito que traz no bolso o projeto de “um mundo melhor” acredita-se, por definição, melhor que o mundo existente. Não há razão mais forte para colocar-se acima de todo julgamento humano, nem para sentir que qualquer quantidade de poder que se entregue nas suas mãos é pouca e mesquinha para a realização de objetivo tão nobre, tão excelso. Nosso Senhor disse aos apóstolos: “Vós julgareis o mundo”. Pelo menos desde o século XVIII, não há um só militante ou mero simpatizante revolucionário que, ouvindo essas palavras, não conclua com lógica implacável: “Isso é comigo.” Por definição, o privilégio de redimir-se mediante a simples alegação de boas intenções imaginárias não se estende jamais aos adversários da revolução. Estes, a priori, agem sempre por motivos egoístas e malignos, mesmo quando nada ganhem e, de coração, tudo sacrifiquem por aquilo em que acreditam. O revolucionário, em contrapartida, santifica-se automaticamente pelo simples fato de sê-lo, mesmo quando se locuplete e desfrute gostosamente dos bens alheios, colhidos a pretexto de salvar o mundo.

Olavo de Carvalho. Sanctus
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