quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

73 - Jango

Jango e o realismo fantástico

ARTIGO – MARCO ANTONIO VILLA
Publicado em O Globo:
 
O Brasil é um país fantástico. Mais ainda, é um país do realismo fantástico, onde ficção se mistura com história e produz releituras ao sabor dos acontecimentos. A última tem como tema a morte do ex-presidente João Goulart, o Jango, na Argentina.
A Câmara dos Deputados fez uma investigação, ouviu dezenas de testemunhas e elaborou um longo relatório. Concluiu que não havia indícios de assassinato. Em entrevista a Geneton Moraes Neto, publicada no livro “Dossiê Brasil: as histórias por trás da História recente do país”, a senhora Maria Tereza Goulart descartou qualquer suspeita de assassinato do seu marido: “Eu estava ao lado de Jango o tempo todo, nos últimos dias. Jango morreu do coração. Tinha feito um regime violento e mal controlado. Chegou a perder 17 quilos em dois meses. E estava fumando muito. O médico já tinha dito que ele não poderia fumar.”
Jango era um cardiopata. E de longa data. No México, a 10 de abril de 1962, em visita oficial, assistindo a uma exibição do balé folclórico mexicano, no Teatro Belas Artes, o presidente teve um ataque cardíaco. Ficou desfalecido por um minuto. Atendido por médicos mexicanos, ficou impossibilitado de continuar a cumprir a agenda presidencial, sendo substituído por San Tiago Dantas. No retorno ao Brasil, o grande assunto era o estado de saúde de Jango e a possibilidade de que renunciasse à Presidência. Afinal, era o segundo ataque cardíaco em apenas oito meses. Dois meses depois, quando da recepção em palácio da seleção brasileira que partiria para a Copa do Mundo no Chile, Pelé manifestou preocupação com a saúde do presidente: “Presidente, como vão estas coronárias?” E Jango respondeu: “Estão boas, mas não tanto quanto as suas.”
Às vésperas do célebre comício da Central (13 de março de 1964), seu estado de saúde inspirava cuidados. Foi advertido que poderia ter sérias complicações com o coração. Jango desdenhou e manteve seu ritmo costumeiro de vida sedentária, alimentação inadequada, excesso no consumo de bebidas e vivendo em permanente estresse. No exílio uruguaio, também devido aos problemas com o coração, foi atendido pelo dr. Zerbini. Na França, onde esteve várias vezes, foi cuidar do coração e chegou a tentar uma consulta com o dr. Christian Barnard, na África do Sul, médico que dirigiu a equipe que fez o primeiro transplante de coração.
A transformação de Jango em um perigoso adversário do regime militar — tanto que o seu assassinato teria sido planejado pela Operação Condor — não passa de uma farsa. No exílio uruguaio, especialmente nos anos 1970, não tinha qualquer atuação política.
Tudo não passa de mais uma tentativa de mitificação, da hagiografia política sempre tão presente no Brasil. O figurino de democrata, reformista e comprometido com os deserdados foi novamente retirado do empoeirado armário. Agora pelos seus antigos adversários, os petistas. Mero oportunismo. É que a secretária dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, pretende ser candidata ao Senado pelo Rio Grande do Sul. E, como boa petista, não se importa de reescrever a história ao seu bel-prazer.
O cinquentenário dos acontecimentos de março/abril de 1964 é uma boa oportunidade para rever o governo Jango. O início dos anos 1960 esteve marcado pela agudização das mais variadas contradições. O esgotamento do ciclo econômico que alcançou seu auge na presidência JK era evidente. A grande migração tinha criado uma sociedade urbana e novas demandas que os governos não sabiam como atender. A tensão gerada pela Guerra Fria azedava qualquer conflito, por mais comezinho que fosse.
É nesta conjuntura que Jango tentou governar. E foi um desastre. Raciocinava sempre imaginando algum tipo de ação que significasse o abandono da política, do convencimento do adversário. Era tributário de uma tradição golpista, típica da política brasileira da época.
Nunca fez questão de esconder seu absoluto desinteresse pelas questões mais complexas da administração pública, distantes da politicagem do dia a dia. Celso Furtado, nas suas memórias (“A fantasia desorganizada”), relatou que entregou o Plano Trienal — que buscava planejar a economia nos anos 1963-1965 — ao presidente depois de exaustivas semanas de trabalho. Jango mal passou os olhos pela primeira página. Em entrevista à revista “Playboy”, em abril de 1999, Furtado foi direto: Jango “era um primitivo, um pobre de caráter”.
No polo ideológico oposto, o embaixador Roberto Campos, também nas suas memórias (“A lanterna na popa”), contou que escreveu um documento de 30 páginas relatando os contenciosos do Brasil com os Estados Unidos, em 1962, quando da visita do presidente a Washington. San Tiago Dantas, ministro das Relações Exteriores, pediu ao embaixador que reduzisse ao máximo a extensão do texto, pois com aquele volume de páginas o presidente não leria. Obediente, o embaixador sintetizou os problemas em cinco páginas, que foram consideradas excessivas. Diminuiu para três páginas. Mesmo assim, segundo Campos, Jango não leu o documento.
As reformas de base, palavra de ordem repetida à exaustão naqueles tempos, nunca foram apresentadas no seu conjunto. A definição — ainda que vaga — apareceu somente na mensagem presidencial encaminhada ao Congresso Nacional quando do início do ano legislativo, a 15 de março de 1964. E lembrar que foram apresentadas como soluções de curto prazo — mesmo sendo mudanças estruturais — durante três anos…
Deixou um país dividido, uma economia em estado caótico e com as instituições desmoralizadas. E abriu caminho para duas décadas de arbítrio.

Marco Antonio Villa é historiador

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

72 - CORREÇÕES DO CADERNO 1 DO 3 ANO


Pessoal, seguem três correções dos textos do Caderno de Humanas 1;

CORREÇÃO 1: Capítulo 4, pág. 484, quadro "A supremacia do Ocidente no mundo".

O número da nota de referência do texto saiu errada (é 1 e não 6) e a referência não apareceu no final do capítulo nem na bibliografia. É do livro de KUMAR, Krishan. Da Sociedade Pós-Industrial à Pós-Moderna: Novas Teorias Sobre o Mundo Contemporâneo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1997, pág. 95


CORREÇÃO 2: Capítulo 6, pág. 498, item b) O nacionalismo antiliberal, ■ O racismo e o antissemitismo.  

O início do texto está incompleto. O texto completo é o seguinte:

■ O racismo e o antissemitismo. Em uma idealizada "época dourada" do liberalismo, o racismo estava cada vez mais disseminado, associado ao imperialismo e ao nacionalismo racial. Teorias antropológicas e biológicas falavam da existência de uma raça branca superior, originária da Europa, e de raças não brancas inferiores, nativas da África (negros) e da Ásia (amarelos). Esse tipo de racismo foi amplamente utilizado para justificar o domínio ocidental sobre os povos africanos e asiáticos na Belle Époque. Além disso, o antissemitismo (ódio ou aversão aos judeus) também crescia, especialmente entre grupos sociais prejudicados ou inseguros com a modernidade, cujos aspectos considerados negativos eram associados aos judeus, como o avanço do materialismo, da grande indústria e do capital financeiro, o declínio de valores tradicionais e a ruína de antigas profissões. Por causa da tradição ancestral de dedicação à leitura religiosa, o que se refletiu em uma educação mais disciplinada e esforçada, os judeus, de fato, destacaram-se em algumas atividades urbanas e modernas, ainda que não fossem a maioria e nem predominassem nessas atividades. Foram os casos das profissões liberais (médicos, advogados), empresariais (comerciantes, banqueiros) e intelectuais (artistas, jornalistas, eruditos, cientistas e militantes políticos, especialmente socialistas). A projeção dos judeus nessas atividades em um contexto político e jurídico de isonomia alcançada ao longo do século XIX com a expansão do liberalismo, favoreceu a ascensão das elites econômicas e da classe média judaica, mas reforçou também o antissemitismo. O velho preconceito religioso de origem medieval (antijudaísmo) foi suplementado e ampliado pelo moderno preconceito racial (os judeus vistos como uma raça, independente de sua religião), derivado do nacionalismo racial. Na Belle Époque, ganhou força entre os antissemitas a ideia de que os judeus eram um povo interessado apenas em bens materiais e no lucro, e que conspiravam para dominar o mundo. Diversas obras foram escritas nesse período falando de uma "ameaça judaica" global, como Os Fundamentos do Século Dezenove (1899), do britânico Houston Stewart Chamberlain, e Os Protocolos dos Sábios do Sião (1903), um falso plano de dominação mundial atribuído aos judeus mas elaborado por antissemitas na Rússia.

CORREÇÃO 3: Capítulo 6, pág. 499, na caixa texto A QUESTÃO JUDAICA NA BELLE ÉPOQUE, no último parágrafo, segunda linha. O correto é:

na França (onde viviam 86 mil judeus ou 0,22% da população francesa)